sexta-feira, 9 de março de 2018

Sobreiros (F. P. não gostava de) - Manuel Alegre


TAMBÉM SOU ALENTEJANO

A José Manuel Mendes
Fernando Pessoa não gostava de sobreiros.
Não sei se saberia do milhafre e do arrepio
circular do seu grito.
Mas percebia com certeza do interdito
da passagem
do rio.
Talvez soubesse do raiano
do mágico logaritmo de outra margem
e de um azul secreto dentro do azul.

Mas ele era só Baixa só urbano.
Sentia na cabeça e na palavra.

Eu gosto dos caminhos para o sul
onde passa o cigano e a rola brava.

E também sou alentejano.

Manuel Alegre, Alentejo & Ninguém, Caminho, 1996, p. 23