domingo, 25 de fevereiro de 2024

Públicos Jardins, de Inverno (de «Canção Doce», Slimani)

- atingida a p. 113 (de 215) desta leitura Ràpida, na NAC., na P. da FIG.a;

RECORTE(s):
       Os jardins públicos nas tardes de Inverno. A morrinha varre as folhas mortas. O cascalho gelado cola-se aos joelhos dos meninos. Nos bancos, nas ruelas discretas, cruzamo-nos com aquelas pessoas que o mundo já não quer. [...]
     Os jardins públicos, nas tardes de Inverno, são frequentados pelos vagabundos, os mendigos, os desempregados e os velhos, os doentes, os errantes, os precários. Os que não trabalham, os que não produzem nada. [...]
      À volta do escorrega gelado, estão  as amas e o seu exército de crianças. Embrulhados em casacos de penas que os estorvam, os pimpolhos correm como grandes bonecas japonesas, com o nariz a pingar de ranho e os dedos roxos. Exalam nuvens de fumo branco que os maravilham. Nos carrinhos, os bebés ajaezados contemplam os irmãos mais velhos. [...] Batem com os pés só de pensar em escapar à vigilância das mulheres que os apanham com uma mão firme ou violenta, meiga ou exasperada. Mulheres de túnica africana no Inverno glacial

Leila Slimani, Canção doce, (2016), 2022, pp. 109-110

terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

«brincar às palavras» (de «Nessa altura já cá não estamos»)

 - terminado só hoje de manhã, na ESP. dos Manos D. + A.; irá ou não para a «Mesa das Trocas»?

RECORTE(S):

     Por vezes fica muito entediada e brinca sozinha às associações de palavras. [...] Quando lhe surge uma palavra muito estranha, fica absorta e surpreendida a pensar nela. Acontece o mesmo em relação aos objectos a que essas mesmas palavras aludem. Acontece-lhe isso com alguidar, por exemplo. Que na sua cabeça é sempre um objecto de cor creme com uma risca castanha. E também com  a palavra macarrão, que tem a estranheza do erre, das estrias longitudinais da massa e do orifício ovalado das extremidades. [...] Como vive numa comunidade bilingue, surgem-lhe à mistura palavras em castelhano e valenciano [...]

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Na cadeira do barbeiro (em «A Arte de Driblar Destinos»)

 - já referidos, os Mestres Finezas de D. (o sr. F., da Calçada S. C. de S., e o sr. M., da Calçada da B. G.)...; para espanto de R., cá pelo Bairro, com tantos Neo-Barb.os, o preço do Corte não pára de baixar...; o narrador protagonista de «A arte...» explicita o final da narração da Primeira Infância, antes de nova mudança da  família para outra casa, noutra terra..., na p.195, no final do cap. 31: «Era o fim de Fevereiro e, como em um drible de Garrincha ficava para trás a minha primeira infância.»;

- [da BiblioPenha, a devolver no dia 9; atingida a p. 220, de 275]

RECORTE(S):

     Nessa época de vizinhança com o ancião Rodolfo, eu às vezes ficava de tocaia na porta da barbearia [...] Eu admirava a coragem da vítima cordata entregue àquelas mãos trêmulas manejando tesouras e navalhas, sem imaginar que logo seria  a minha vez. Aconteceu alguns dias antes do meu aniversário de dez anos, quando me sentei naquela cadeira, sujeitado ao desejo de minha mãe de me ver com um corte profissional. O longo pano preto que recebi sobre o peito, indo até cobrir as pernas, e o modo apertado como o barbeiro amarrou com um nó os cordões atrás do meu pescoço, me fez sentir prisioneiro, [...] Ao ouvir sons sibilantes, virei o olhar um pouco para o lado, a tempo de perceber as mãos trêmulas afiando a navalha  numa  tira de couro, e logo o movimento da lâmina reluzente em direcção à minha cabeça, no fito de aparar os pés do cabelo e desenhar a linha recta da nuca. Foram instantes terríveis, e tive pensamentos  de rebeldia, mas estava preso à cadeira e minha única defesa foi cerrar os olhos. [...]

Celso Costa, A arte de driblar destinos, 2023, p. 129