segunda-feira, 11 de maio de 2020

«Quem Espera Desespera» - António Araújo

- Crónica de 9 de Maio, no «DN», «percorre»  o Motivo da Espera (e os do Silênco e do Naufrágio...) no contexto da Pandemia,  neste quadro, do Pintor  Richard Oelze , na «Jangada de Medusa», de Théodore Géricault, em obras  japoneses, em obras literárias  - grande Percurso curto...

RECORTE(S)
Quem espera desespera. O tema tem sido muito glosado por estes dias, dias de convívio difícil, para alguns quase impossível, com o contrário daquilo que medularmente somos, pessoas ou sociedades ruidosas e ansiosas. Justamente a antítese do que de nós se exige agora, o silêncio e a espera.
Como fraco lenitivo, alguns têm lembrado exemplos da literatura e da arte: [...]
[...] Na tela de Oelze, deparamos com um grupo de cavalheiros de gabardina e chapéu, que surpreendem pela uniformidade quase castrense, e algumas senhoras, poucas, de casacos de peles e também chapéus, numa atmosfera elegante, urbana, bastante deslocada da paisagem rural envolvente. A luz, estranhíssima, mais lunar do que solar, projecta-se sobre o grupo vinda do lado esquerdo, provavelmente a partir das costas de damas e de cavalheiros; à traição, portanto. O ajuntamento compacto, igual aos que se formam para contemplar os desastres e as calamidades quotidianas, confere ao quadro uma intensa carga trágica ou, melhor dizendo, prenuncia-a, num momento de suspensão e suspense que é apanágio de todas as narrativas da espera.  [...]

sábado, 2 de maio de 2020

«A humana voz»


A humana voz

Então, a passear o Saco? Quem não tem cão com saco caça. Últimos dias dos quarenta e cinco iniciais.  Repete a curta deambulação matinal. Saudoso de ouvir: Então, já de férias outra vez?
À mesma hora, o mesmo inventário da Penha, as mesmas Velhadas. Jornal, e, ou, revista para a General, café, compras mínimas garantidas e ala que se faz suspeito.
Ironias do Destino. Há décadas e décadas profissional do distanciamento activo, experimenta agora o passivo. O de um Grande Irmão? Uma proteína com Capa, afinal. Mundo às avessas. 
Solta-se o bicho quando repete que está a adorar a via virtual, quer na rua, quer nas curtíssimas sessões síncronas. Alguém apaga a Luz. Só aí acordam, querem saber porquê. Esquiva-se, como sempre.
Quarenta minutos semanais. Cronometrados com magistral requinte. Não há os execrandos desperdícios de tempo do quadrado «ao vivo». Os que se escondiam atrás da pequenina máquina têm agora vida facilitada. Basta desligar a microcâmara.
Seja às 11 ou às 15, apresentam-se espapaçados. Poupados à ansiedade da prova universal, nem disfarçam o contentamento, a indiferença arrogante. Bem tenta, duas ou três vezes, expandir leituras, solicitar-lhes a voz. Em vão.
Gostei muito de os ver. Cuidem-se. Saúde.  Até para a semana.
Até à data, intrusão, só a de uma ave canora que guinchava.
Eliminados os efeitos do desgaste presencial, já se prepara para mais um ano. Ainda por cima, imprevisível. E há uma nova semente lançada. Para Dezembro.
AVC em palco? Adiado.

Fausto