- no «A Vida Breve» de ontem, 2 de Novembro de 2017
VENEZA AOS GATOS
Assinar a Pele, Assírio & Alvim, 2001
VENEZA AOS GATOS
Lisboa às moscas e Veneza aos gatos…
(os pombos da bondade só conspurcam
a praça de S. Marcos)
… ao gato perna alta que não vem quando o chamas,
ao contrário da patrícia mosca,
que não era para aqui chamada,
mas logo te soprou os últimos zunzuns
mal chegaste a Lisboa.
O gato de Veneza não te dá pretextos
para miares o que te vai na alma, [mala?]
nem os sacros temores da miaulesca
esfinge rilkeana.
Não é um gato é um perfil de gato
tapando a saída da calleta.
O gato veneziano é gato sem regaços
e sem selvajaria.
De Veneza o gato é sempre muitos gatos
que vão à sua vida…
… como tu, afinal, não vais à tua.
(De Veneza a Lisboa, num zunido,
já trazias a mosca no ouvido…)
Alexandre O'Neill, de Feira cabisbaixa, 1965; transcrito da p. 259 das Poesias completas, I.N. C.M. , 1990 (também em Assinar a pele...)
Assinar a Pele, Assírio & Alvim, 2001