domingo, 28 de fevereiro de 2016

«Boca do Inferno» - Castro Mendes

BOCA DO INFERNO

Procuras um país no teu país
que não existe e não existiu nunca.
O rosto com que fita o teu país
é uma face feita rocha adunca

a tirar-nos da terra, não esqueças:
«o meu país é o que o mar não quis»;
e vê a aridez, que pede meças
à meseta deserta de Madrid!

 Pois da Europa assim fomos dizendo:
«o rosto com que fita é Portugal».
Mas o mar, por temível e tremendo,
era mesmo assim o nosso igual.

Agora fita a Boca do Inferno,
vem meditar no Portugal moderno!

(com versos de Ruy Belo e Fernando Pessoa)

Luís Filipe Castro Mendes, Outro Ulisses regressa a casa, 2016 (fev.), Assírio & Alvim, p. 41