[«esquecido» como sempre, E. «entrou» atrasado na «Sessão de Pares» e, no «paralelo», M. J. C. disse que tinha apreciado o poema de P. T. que E. deixara «pela Mesa» do Qd.o «DDT»; enquanto aquela «decorria», passou-lhe outro, o que segue, pelo «2.º paralelo»...]
O ROSTO COM QUE FITA
A lenta descida das alturas do clima
para o espaço físico, sem memória,
sem bandeiras, sem oráculos nem heróis.
para o espaço físico, sem memória,
sem bandeiras, sem oráculos nem heróis.
Envolta numa bandagem de gelo,
a Europa, nas primeiras horas da manhã
de Março, entre o display e a escotilha,
entre o mapa e o território, adormecida,
por momentos, na ausência de poder
que se deduz da plácida geografia.
É uma questão de escala e de altitude
o desejo do cartógrafo: medir o espaço
e desenhar-lhe com os dedos os contornos.
Este o prazer secreto da agrimensura,
a passagem, numa pausa entre nuvens,
de paisagem árida, lunar, à topografia.
Portugal é uma orla, um fino recorte
do mundo, e torna-se mais nítido
o rosto com que fita o oceano.
Em baixo, os pequenos pontos luminosos
são o presente e a intenção que move
os veículos pelas estradas nacionais.
Desces para uma história de vida,
além da mancha de retalhos da lavoura.
O rio, as pontes, a torre e o mosteiro,
as docas vazias de Alcântara, pontuam
de referências conhecidas o cenário
onde encenar de novo uma pertença -
a trepidação no regresso ao script de origem,
ao logos de nascença, a razia aos prédios
e a queda inapelável no real quotidiano.
Paulo Teixeira, a comoção do mundo, Caminho, 2020, pp. 31-32