Recortes da crónica de hoje de Miguel Esteves Cardoso:
Há as
pessoas que têm pena de eu estar a ler um livro. Sentam-se para me fazer
companhia — porque qualquer tipo de conversa é preferível à tortura solitária
de estar embrenhado num livro.
Digo que tenho de acabar o livro. Sorriem: “Eu sei o que é estar só. Eu
também já fui ostracizado, durante a puberdade, nas berças onde nasci.”
Depois há os que pedem desculpa por interromper a leitura. Como não lêem
habitualmente livros, não fazem ideia do que estão a fazer.
[...]
Interromper obriga a reler e a trazer para a terra parágrafos que foram
feitos para voar. A concentração não é um esforço físico: é um resultado da
qualidade do livro e da força com que nos prende.
Interromper é arrancar-nos deste estado de graça que é a pura e deliciosa
distracção — e que não se pode ligar e desligar como se estivéssemos a ler uma
palavra de cada vez, como se um romance fosse só uma lista de palavras que se
pudesse retomar em qualquer fragmento.
Onde é
que eu estava? No paraíso